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Cotas raciais em concursos públicos

Você se enquadra ou não nos parâmetros legais?

Do ponto de vista racional não se justifica fazer qualquer distinção entre pessoas. Contudo, a lei de cotas em concursos públicos, foi legislativamente justificada do ponto de vista histórico no Brasil, visto que temos uma injustiça social histórica que não foi superada até hoje.

O problema racial no Brasil não foi superado até hoje, sendo que, neste contexto especialistas definem a lei de cotas como um ‘preconceito positivo’.

 

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1. As ações afirmativas e as cotas raciais em concursos públicos

As ações afirmativas são medidas discriminatórias positivas. Elas discriminam para integrar, ao contrário das medidas discriminatórias negativas, que servem para segregar.

As ações afirmativas tentam favorecer alguém que foi historicamente discriminado e desfavorecido por políticas e formas de dominação que são consideradas injustas e desumanas pelos acordos e tratados internacionais de direitos humanos.

Em áreas como universidade, mercado matrimonial e relações com a polícia, a cor das pessoas tem maior importância, já em áreas vinculadas basicamente ao domínio do lazer (como as artes, o esporte, etc.) e à religião essa importância é menor.

Estudos indicam que no Brasil a desigualdade social está associada à desigualdade racial. Neste sentido, as cotas raciais em concursos públicos federais estão sendo usadas como instrumento que tenta corrigir essa desigualdade de oportunidades.

2. A lei de cotas raciais em concursos públicos

Em junho de 2014 entrou em vigor a Lei nº 12.990, que destina uma porcentagem das vagas de concursos públicos federais para negros e pardos.

Passados mais de cinco anos, ainda persistem muitas dúvidas entre os candidatos que pretendem alcançar sua vaga em concurso público por este meio.

Algumas das dúvidas mais comuns são: “Quem é considerado negro ou pardo?”, “Posso concorrer à cota e à ampla concorrência?”, “Como provar que sou negro ou pardo?”, “Para quais concursos a lei é válida?”.

Caso você se encontre nessa situação, esse post foi feito para você!

 

3. Perguntas freqüentes e suas respostas – Parte 1/2

3.1. Qual é o tamanho da reserva? Qual é a abrangência dessa lei? Ela se aplica a quais concursos?

A lei reserva de 20% das vagas em concursos para a administração pública federal direta (ex: Ministérios) e indireta, para autarquias (ex: INSS, Bacen), agências reguladoras, fundações públicas (ex: universidades federais), empresas públicas (ex: Correios, Caixa Econômica) e sociedades de economia mista (ex: Petrobrás, Banco do Brasil) controladas pela União + FEDERAIS +  ligadas ao Poder Executivo, além das Forças Armadas [as vagas oferecidas nos concursos promovidos pelas Forças Armadas sujeitam-se à política de cotas prevista na Lei 12.990/2014. (STF. Plenário. ADC-ED 41/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 12/4/2018)].

Os concursos estaduais e municipais podem fazer reservas semelhantes se existir uma lei estadual ou municipal com tal previsão, como de fato já existem algumas.

No âmbito dos concursos do Poder Judiciário existe uma resolução do CNJ que disciplina reserva de cotas raciais, de forma semelhante ao que é tratado neste post.

 

3.2. Quem pode concorrer às vagas reservadas aos cotistas?

Podem concorrer às vagas da cota racial todos que se autodeclararem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso.

3.3. Os candidatos cotistas poderão participar, também, da ampla concorrência?

Os candidatos podem disputar tanto as vagas reservadas, quanto as destinadas à ampla concorrência. No entanto, caso o candidato seja aprovado dentro da ampla concorrência, seu nome não será computado para o preenchimento das cotas.

3.4. Qual a relação da cota racial com a quantidade de vagas ofertadas?

Quando o número de vagas oferecidas for de 3 ou mais haverá a cota racial. Ou seja, se o concurso prever menos que 3 vagas, não haverá cotas para negros/pardos.

Observação: Ao ser aplicado o parágrafo primeiro, perfaz um percentual de 33,33% de reserva de vagas, o que se constitui em uma sensível impropriedade na previsão legal e que supera, outras reservas legais existentes em nosso ordenamento jurídico.

No caso de 20% das vagas resultar em um número fracionado, será arredondado para cima sempre que a fração for igual ou maior que 0,5, e para baixo quando for menor que 0,5.

No edital aparecerá um número de vagas reservadas para candidatos negros. E quem são os “candidatos negros”? Preste atenção! São aqueles que se autodeclararem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso público, conforme o quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.

 

3.5. A cota prevista na Lei n.º 12.990/2014 é válida para concursos do MPU (Ministério Público da União) e dos Poderes Legislativo e Judiciário da União?

NÃO. A Lei n.° 12.990/2014 tem aplicação restrita ao Poder Executivo Federal.

 

3.6. A cota é válida para concursos da DPU (Defensoria Pública da União)?

Trata-se de tema polêmico, mas como a defensoria pública possui iniciativa de lei para sua organização interna, entende-se que NÃO.

Inclusive o STF entende que a Defensoria Pública goza de autonomia administrativa, razão pela qual não pode ser considerada como sendo um órgão vinculado à estrutura do Poder Executivo. Assim, para o STF: “qualquer medida normativa que suprima essa autonomia da Defensoria Pública, vinculando-a a outros Poderes, em especial ao Executivo, implicará violação à Constituição Federal.”

 

3.7. Como saber quantas vagas estão reservadas para cotistas?

O edital do concurso deverá especificar o total de vagas reservadas aos candidatos negros para cada cargo ou emprego público oferecido.

 

3.8. Em concursos com cotas raciais, como fica a reserva de vagas para portadores de deficiência?

Nos concursos para servidores públicos federais, a Lei já prevê a reserva de até 20% das vagas para pessoas portadoras de deficiência, sendo que são reservas de vagas distintas e complementares.

 

3.9. As cotas raciais em concursos públicos sempre existirão? São para sempre?

O sistema de cotas para negros/pardos previsto na Lei nº 12.990/2014 acaba em 2024.

 

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4. Concursos públicos

O Estado brasileiro adotou ao longo dos tempos inúmeras maneiras de escolher seus servidores como sorteio de vagas entre os candidatos concorrentes, sucessão hereditária, arrendamento, nomeação e entre outras. Atualmente o instrumento de escolha é o concurso público, visando a seleção dos mais preparados para a investidura no serviço público.

O concurso público é o procedimento administrativo que tem por fim aferir as aptidões pessoais e selecionar os melhores candidatos ao provimento de cargos e funções públicas. Na aferição pessoal, o Estado verifica a capacidade intelectual, física e psíquica de interessados em ocupar funções públicas e no aspecto seletivo são escolhidos aqueles que ultrapassam as barreiras opostas no procedimento, obedecidas sempre à ordem de classificação.

A Lei nº 12.990/2014 não viola o princípio do concurso público. Isso porque, para serem investidos nos cargos públicos, os candidatos negros e pardos têm de ser aprovados no concurso. Caso não atinjam o patamar mínimo serão desclassificados.

 

5. Origem genética

Bom… minha bisavô era negra… inclusive era escrava… tenho sangue negro nas veias… posso concorrer nas vagas de cotas raciais?

Segundo o Supremo Tribunal Federal não é cabível o exame genético para se estabelecer se uma pessoa é negra ou parda.

Entende-se que o exercício do preconceito se dá na percepção social da imagem exterior do indivíduo, e não na carga genética do sangue que corre em sua veias.

Lembre-se… você já viu isso nas aulas de biologia/ciências… fenótipo (= imagem exterior de um dado indivíduo) é uma decorrência de sua genética pessoal e sua interação com o meio ambiente em que circula.

Alguns autores defendem que a lei objetiva atender as pessoas de pele mais escura, que são os que mais sofrem preconceito. Para estes autores aquelas pessoas que possuem afrodescendência, mas que possuem a pela mais clara, não devem concorrer às vagas para a Lei de cotas raciais.

6. A autodeclaração

A base da lei, para que uma pessoa concorra a essas vagas reservadas para as cotas raciais, está centrada na autodeclaração.

Na autodeclaração, você preencherá uma ficha ou formulário, on line ou não, em que irá declarar que se reconhece como negro ou pardo.

O STF afirmou que o critério da autodeclaração é constitucional. Isso porque deve-se respeitar as pessoas tal como elas se percebem.

A grande dificuldade está em saber quem são os possíveis beneficiários e a identificação dos casos de declaração falsa, especialmente levando em consideração o elevado grau de miscigenação da população brasileira.

Regra geral: quando houver dúvida razoável sobre o fenótipo (= aparência da pessoa), deve prevalecer o critério da autodeclaração da identidade racial. Vale lembrar que o Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010) que a autodeclaração é ferramenta legítima para o acesso as políticas de ações afirmativas no âmbito federal.

 

7. Heteroidentificação

Estamos no Brasil, em que reina a indesejável cultura de se querer, sempre, levar vantagem. O risco de oportunismo no exercício de autodeclaração falsa pode inviabilizar a política pública. Neste contexto, para tentar se contornar este problema, o STF entende que é legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação para fins de concorrência pelas vagas reservadas, para combater condutas fraudulentas e garantir que os objetivos da política de cotas raciais sejam efetivamente alcançados, desde que respeitada a dignidade do candidato.

O STF sugere que na heteroidentificação sejam utilizados mecanismos adicionais à autodeclaração, tais como: (1) a elaboração de formulários com múltiplas questões sobre a raça (para se averiguar a coerência da autoclassificação); (2) o requerimento de declarações assinadas; (3) o uso de entrevistas; (4) a exigência de fotos; e (5) a formação de comitês posteriores à autoidentificação pelo candidato. A possibilidade de seleção por comitês é a alternativa mais controversa das apresentadas, os quais já foram batizados de “TRIBUNAIS RACIAIS!”

Visando suprir essa lacuna normativa na regulamentação da Lei de cotas raciais, foi publicada em abril de 2018 a Portaria Normativa nº 4, que tentou estabelecer parâmetros para verificação se um determinado candidato é, realmente, preto ou pardo.

A Portaria possui alguns elementos importantes, entre eles destacam-se:

  • A previsão e utilização de procedimento de heteroidentificação é obrigatória no âmbito dos concursos para provimento de cargos públicos da administração pública federal, direta, autárquica e fundacional;
  • A heteroidentificação se configura em procedimento complementar à autodeclaração dos candidatos;
  • Haverá diversidade na composição da comissão de heteroidentificação, garantindo-se distribuição de seus membros por gênero, cor e, preferencialmente, naturalidade;
  • Utilização do critério fenotípico (que consiste na manifestação visível ou detectável da condição genética de um determinado indivíduo);
  • Previsão de fase recursal;
  • Necessidade de decisão fundamentada (parecer motivado), a ser proferida pela comissão de heteroidentificação e órgão recursal.

As bancas examinadoras costumam “detalhar” os requisitos da portaria, determinado os fatores que devem ser observados pelo candidato na hora da avaliação da comissão de heteroidentificação:

  • O autorreconhecimento como negro, seja de pele preta ou de pele parda. Isso deve ficar claro para a comissão, pois a pessoa que se enxerga como negra já viveu diversas experiências na vida que comprovam sua identidade como, por exemplo, o racismo;
  • A pessoa tem que parecer negro quando da avaliação pela comissão. Informações que a família é descendente de negros pode não ser levada em consideração;
  • A utilização de procedimentos estéticos pode levar ao indeferimento;
  • O fato do candidato já ter sido aprovado por outra comissão de heteroidentificação não garante nova aprovação.

O critério adotado para definir a quem será reservada ou não a vaga do concurso público como cotista, não é capaz de coibir situações de injustiças, bem como atestar, sem sombra de dúvidas, qual candidato cotista seria beneficiado ou não pela ação afirmativa, por não trazer em seu conteúdo requisitos objetivos a serem preenchidos.

 

8. Porque na heteroidentificação não são usados critérios objetivos de avaliação?

A avaliação realizada pela comissão verificadora é baseada em critérios fenotípicos que identificam o candidato como negro (preto ou pardo), constituindo atividade de cunho eminentemente subjetivo, sendo defendido por muitos que não há como serem estabelecidos critérios objetivos.

Os defensores da não adoção de critérios objetivos, por mais estranho que pareça, defendem que “o estabelecimento de critérios objetivos pode implicar em ato de discriminação”.

Os defensores deste estranho ponto de vista defendem que a previsão em edital de critérios objetivos para caracterizar a raça negra – apontando objetivamente quais características possuem uma pessoa preta ou parda – importa em verdadeiro ato de discriminação e racismo que seria praticado pela União acaso constasse características específicas em edital.

Vejamos a manifestação de um juiz, em uma sentença, já sem paciência para falta de critérios na heteroidentificação: POIS BEM, mesmo se aceitando aqui (por imposição da decisão do STF), a validade do sistema de “cotas raciais” e, também, do critério da heteroidentificação (figura dos tempos da escravatura cuja constitucionalidade, como dito, também foi afirmada pela Suprema Corte), não há como se aceitar a validade do ato administrativo vergastado, na medida em que este não aponta o critério objetivo como base no qual concluiu que o autor não é negro ou pardo. Pergunto: com fundamento em que a tal Comissão Avaliadora chegou à conclusão que o autor possuiria uma suposta “raça pura”? Pois disso se trata! Se ele não é pardo, isto é, se não é mestiço, ou seja, se não é o resultado de um cruzamento – ainda que em gerações anteriores – de pessoas de “raças diferentes” (sejamos redundantes porque há quem não consiga assimilar isto), a única conclusão a que podemos chegar é que a “Comissão Avaliadora” concluiu que o autor seria um “branco puro”, talvez pertence à mítica “raça ariana”. Nada mais ridículo, para não dizer racista!

Vejamos por onde tem caminhado o subjetivismo de uma dada banca examinadora.

As entrevistas realizadas por tal banca examinadora foram gravadas em mídia digital. Nessas entrevistas, são realizadas perguntas sobre a condição sócio-econômica do candidato, se ele concorda com a política de cotas, dentre outras, que extrapolam a mera verificação das características fenotípicas dos negros/pardos para perquirir sobre a ideologia política e social do candidato. A simples existência de tais perguntas faz crer que é com base nesta ideologia político-social que a banca examinadora vem decidindo quem merece ser contemplado com a política de cotas e quem não merece.

Não é plausível se permitir que o candidato seja submetido a um procedimento de verificação da condição de cotista, sem que sequer haja previamente a fixação dos critérios e aspectos que deverão ser observados de maneira objetiva, sob pena de violação ao Princípio da Isonomia, vez que para cada candidato pode ser aplicada uma avaliação diversa.

 

Caso Verídico

Em um caso levado à Justiça, a candidata eliminada argumenta que, em nenhum momento foi apresentado o motivo da eliminação, tendo em vista que a requerente é parda e atingiu a nota maior do que o último selecionado (…)

A candidata argumentou que tem o fenótipo (= aparência) que desfere sua ascendência afro, como: tom de pele, cabelo afro, nariz arredondado, quadris largos, lábios largos entre outras características.

A candidata argumentou ainda que, ao longo de sua vida, sofreu diversas situações de opressão de raça, como perguntas racistas em entrevistas de emprego, críticas ofensivas que seus familiares faziam sobre o seu cabelo natural e ‘bullying’ vivido em sua adolescência devido aos seus aspectos de raça negra, bem como o apelido recebido referente ao seu cabelo, sendo chamado por cabelo de “bombril”.

A candidata argumentou ainda que já foi reconhecida como negra em outros concursos como o VII Concurso de Provas e Títulos / Defensor Público do Estado de São Paulo.

(…)

O Juiz solicitou que a banca examinadora especificasse qual o critério utilizado para decidir acerca dos fenótipos de negro dos candidatos que preencherem a autodeclaração.

(…)

A banca examinadora de concurso informou que em todas as avaliações a comissão verificou e considerou as características físicas correspondentes à população negra. Desse modo foram observados aspectos como: cor da cútis, cabelo, formato do nariz e dos lábios.

(…)

Neste caso, visto se tratar de decisão a ser baseada em prova técnica, o juiz mandou que fosse realizada prova pericial visando a análise da alegada condição de parda da parte autora, de acordo com as características fenotípicas especificadas pelo IBGE.

 

9. Da garantia do contraditório e ampla defesa

Muitas bancas examinadoras abusam ao “fazerem” uma análise muito superficial dos recursos que lhe são apresentados quando um candidato é desclassificado.

Há casos em que todos os recursos apresentados por candidatos que se auto declararam “afro-descendente” foram indeferidos. Decisão genérica, que não analisou, em grau de recurso, as particularidades de cada caso concreto.

 

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10. A ditadura do fenótipo

Como a base da lei está no fenótipo, chegamos a controversos absurdos… Alguns autores entendem que “candidatos que tenham tido o fenótipo negro em outros contextos da vida, mas que tenham recorrido a procedimentos estéticos ou cirúrgicos a fim de minimizar suas características negroides, a ponto de não mais serem reconhecidos socialmente como negros, não fariam jus ao benefício das cotas”.

Assim, por mais absurdo que pareça, procedimentos estéticos para alisar o cabelo ou para clareamento da pele pode levar a comissão avaliadora a não mais reconhecer você como negro/pardo e indeferir seu pedido para fazer jus a Lei de cotas raciais.

O candidato precisa parecer negro (ou pardo) para entrar fazer jus a Lei de cotas raciais.

Segundo a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial do Governo Federal: “Dentro da análise fenotípica, o que leva em consideração é uma aparência do indivíduo que num processo de classificação ou de discriminação, seria identificado como negro, devido aos traços negroides de boca, formato do rosto, tipo de cabelo, cor de pele.”

 

Questão Relevante: Uma pessoa que tem todos os traços de negro, cabelo, nariz, boca… porém é branca. Tenho dúvidas se poderia ou não se encaixar na lei de cotas. Como se deve proceder? O cidadão que se autodeclara negro pode concorrer, porém pode não ser considerado negro por ter a pele clara. Como fazer?

Resposta: De forma geral, no caso desta ocorrência, uma das alternativas é o ajuizamento de Mandado de Segurança, a fim de comprovar o que foi alegado. Para se vencer ou não essa ação vai depender do conteúdo das provas.

 

11. Quem são os pardos?

Alguns autores consideram que os pardos são aquelas que tem mãe negra e pai branco ou vice versa. Ou aquelas cujos ambos os pais são pardos.

Segundo o IBGE pelo menos 97.650.000 (NOVENTA E SETE MILHÕES, seiscentos e cinquenta mil = 46,5%) brasileiros são pardos. Segundo o mesmo instituto, negros são outros 19.530.000 (DEZENOVE MILHÕES, quinhentos e trinta mil = 9,3%) de brasileiros. Somados, negros e pardos correspondem a 55,8% da população brasileira, ou seja, 56 a cada grupo de 100 brasileiros podem ser cotistas.

Percebe-se que essa lei não reserva vagas em concursos públicos para uma minoria, visto que um grupo formado por pretos e pardos é o predominante na população brasileira.

A lei remete ao IBGE a definição de quem é pardo, para tanto o IBGE utiliza-se da autodeclaração pessoal. Em caso de negativa de reconhecimento pela banca examinadora, a autodeclaração pode ser confirmada por outras provas produzidas para desestabilizar a conclusão da banca examinadora.

A classificação do IBGE valoriza à cor, isto é, às tonalidades da pele, em especial, pela categorização de um termo próprio, o “pardo”, cuja cor está na linha divisória e intermediária entre o preto e o branco.

Uma determinada banca examinadora afirma que: “o pardo, para fins da política de inclusão em foco, deve ser entendido como o preto de pele clara, e deve apresentar, independentemente de ter a cor de pele mais clara, características fenotípicas de pessoas negras, as quais serviram ao longo de sua vida como obstáculo, colocando-o à margem da sociedade”.

Qual a base restritiva do conceito de pardo? Qual sua previsão legal? A banca examinadora pode legislar?

Uma dada banca examinadora, defendendo-se em um processo judicial, assim se pronunciou: Ao analisar a autodeclaração do candidatos inscrito no processo seletivo objeto deste ação, a banca examinadora deve adotar como parâmetro de comparação do fenotípico apresentado por cada candidato aquele próprio da pessoa negra, assim definida no inciso IV do parágrafo único do art. 1º da Lei 12.288/2010 como sendo a pessoa que se autodeclaram preta ou parda, resultante da miscigenação verificada entre pessoa de cor preta com outra de outra cor, sob pena de subversão da ordem jurídica, em havendo de interpretar-se necessariamente a norma do art. 2º da Lei 12.990/2014 à luz daquela inscrita no art. 1º da mesma Lei, uma vez que a reserva de vagas nas seleções públicas destinou-se exclusivamente aos negros, aí incluídos somente os pardos de origem negra, cuja cor preta é inerente à sua ontologia fenotípica, e não os demais pardos resultado da miscigenação entre outras raças que não a negra, os quais não são alcançados pela norma do art. 1º da Lei 12.990/2014, que expressamente limitou aos negros a expressa reserva de postos de trabalho na esfera administrativa, no cumprimento do esforço de promoção da igualdade racial estatuída pela Lei 12.228/2010, sendo não dotada de juridicidade alegações contrárias a essa conclusão sustentada pela parte autora, à guisa de fragilização e atribuição de ilegalidade na conduta da banca examinadora do certame.”

A pergunta que deve ser feita quando da desclassificação de um dado candidato é: se a banca examinadora não o considerou como pardo, em que cor ou raça ela enquadrou o candidato? Pois, segundo o IBGE, só existem cinco tipos de raças possíveis, quais sejam: preta, parda (incluindo-se nesta categoria a pessoa que se declarou mulata, cabocla, cafuza, mameluca ou mestiça de preto com pessoa de outra cor ou raça), branca, indígena (considerando-se nesta categoria a pessoa que se declarou indígena ou índia) ou amarela (compreendendo-se nesta categoria a pessoa que se declarou de raça amarela).

Segundo o STF, se deve “ter bastante cautela nos casos que se enquadrem em zonas cinzentas. Nas zonas de certeza positiva e nas zonas de certeza negativa sobre cor (branca ou negra) do candidato, não haverá maiores problemas. Porém, quando houver dúvida razoável sobre o seu fenótipo, deve prevalecer o critério da autodeclaração da identidade racial.”

O Professor José Eustáquio Diniz Aves, em seu artigo que fala sobre a definição da cor parda obtida no manual do IBGE, in verbis, esclarece que:

“Fica evidente pela definição do manual do recenseador do IBGE que pardo não é “marrom”, “trigueiro”, “escurinho” ou outra tonalidade de cor entre o branco e o preto. Pardo, na definição do manual é uma mistura de cor, ou seja, é uma pessoa gerada a partir de alguma miscigenação, seja ela mulata, cabocla, cafuza, mameluca ou mestiça.
Sem dúvida são pardos os filhos de indivíduos brancos (ou indígenas) com pretos – afrodescendentes. Mas também são pardos: o filho de uma pessoa branca com uma indígena, o filho de uma pessoa amarela com uma indígena, o filho de uma pessoa branca com pessoa amarela, ou os filhos de pessoas pardas com as demais cores ou com indivíduos indígenas. Portanto, pardo são todas as pessoas mestiças nascidas de relacionamentos sexuais entre indivíduos de etnias diferentes.

Pelo exposto, percebe-se que é um erro se classificar como NEGROS todos os indivíduos que se auto declaram pardos. Existem muitos pardos no Brasil que são ameríndios-descendentes e outros que são asiático-descendentes. Portanto, existe uma parcela da população parda no Brasil que não tem qualquer ascendência africana“.

 

12. O que as bancas examinadoras tem observado quando vão avaliar um candidato?

Cor da cútis; cabelo; nariz negroide, notadamente aquele com formato achatado e largo, com narinas grandes e redondas; a etnia negroide é atribuída ainda a característica de lábios grossos; características pessoais que podem ser vítimas de discriminação racial.

Uma dada banca examinadora informou que avaliou os traços fenotípicos de “tons de pele, às texturas do cabelo e aos traços fisionômicos, elementos visuais que, via de regra, servem como marcadores para excluir pessoas negras, a despeito de seus potenciais”.

Um caso avaliado por uma banca examinadora concluiu, com base nos “critérios” estabelecidos acima que: “para se valer do benefício legal não basta a candidata se autodeclarar negra ou parda, ela tem que parecer negra/parda, vivenciar essa autodeclaração, e não foi este o contexto delineado, pois a candidata, além de se apresentar socialmente com os cabelos lisos, em que pese alegar serem crespos, possui, visualmente, traços finos em sua face, como nariz, boca e face, traços fisionômicos que a excluem do regime de cotas”.

Uma dada banca examinadora em seu formulário de inscrição, exige que o candidato forneça as seguintes informações:

  1. Alguém já o(a) discriminou por sua cor?
  2. Já o(a) chamaram por sua cor (exemplo: negra, morena)?
  3. A maioria dos seus amigos é de cor preta ou parda?
  4. Você namora ou já namorou uma pessoa de cor preta ou parda?
  5. A maioria dos seus ídolos é de cor preta ou parda?
  6. De que cor ou raça você se considera?

 

Caso Verídico

Um candidato eliminado na fase de heteroidentificação, atualmente ocupante do cargo de Técnico do Seguro Social, para o qual foi nomeado em uma vaga reservada às cotas de negros, após aprovação em concurso realizado pela mesma banca organizadora, tendo sido inclusive aprovado em procedimento de verificação da condição autodeclarada de negro, questiona sua desclassificação.

O juiz concluiu que em oportunidade anterior, o autor submeteu-se a certame promovido pelo INSS, com a mesma banca examinadora, onde concorreu a vagas destinadas a negros/pardos. Aprovado nessa condição, foi nomeado e atualmente exerce o cargo de técnico daquela autarquia.

Não se mostra razoável que a Administração Pública, agora, em idêntica situação, não mantenha o enquadramento do autor como negro ou pardo, sob pena de ofensa à segurança jurídica, deve-se ter em conta a necessidade de estabilidade das relações jurídicas, porquanto a possibilidade de frustrar legítimas expectativas promove a insegurança jurídica, o que fragiliza o Estado Democrático de Direito.

Podemos fixar um entendimento. Se uma banca examinadora já atestou a condição negra num dado candidato, esse atestado será válido para os próximos concursos que eventualmente ele venha participar, tendo em vista que a característica aqui avaliada, raça, é imutável no tempo.

 

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13. Perguntas freqüentes e suas respostas – Parte 2/2

13.1. Qual o documento capaz de comprovar que sou negro ou pardo?

O documento, que será confrontado com a realidade, é a autodeclaração.

13.2. Como serão descobertas as declarações falsas?

Durante o concurso ocorrerá, antes da nomeação, a heteroidentificação.

Também se tem as hipóteses de denúncias feitas por cidadãos e apuradas pelo Ministério Público.

Comprovada que a declaração é falsa, o aprovado, em regra, será eliminado do concurso.

Caso já esteja no serviço público, poderá ter sua nomeação anulada, dependendo, entretanto, de procedimento administrativo prévio.

Além disso, o candidato ainda poderá ser processado criminalmente.

 

13.3. Como as bancas avaliadoras vem se comportando?

Uma dada banca examinadora se defendendo argumentou que o requisito para ser enquadrado como afrodescentente “não é a descendência e sim a identificação de traços fenotípicos que o caracterizam na sociedade como pertencente à raça/etnia negra”, ou seja, “se o candidato possui características pessoais, visíveis, não genéricas, que o identificam perante a sociedade como negro ou pardo”.

As bancas argumentam que se dedicam ao trabalho de analisar os registros audiovisuais e fotográficos de indivíduos que, em função de um conjunto de elementos fenotípicos, estão sujeitos cotidianamente à violência do racismo.

Finalmente argumentam que o fato de uma pessoa ser não branca não significa reconhecer compulsoriamente que seja negra.

Essa afirmação acima é correta, mas não enfrenta a principal dúvida: quem são os pardos?

Vejamos como uma banca avaliadora se pronunciou ao ser questionada porque um irmão foi enquadrado como cotista e outro não.

“Não há que aludir discrepância quando a mesma banca considerou a irmã da candidata negra, que possui a mesma origem genética, cultural, social e econômica, uma vez que, conforme exaustivamente salientado, a avaliação feita pela banca considerou o fenótipo apresentado pelos candidatos, a partir de sua visualização na entrevista presencial, independentemente de genética.”.

As bancas examinadoras estão legislando! Vejamos a afirmação feita por uma delas:

“A Lei 12.990/14 alcança somente os negros, de cor preta ou parda, e que a banca examinadora constatou, quando da realização da entrevista, não ser ou autor negro, nem negro de cor parda.”

Vejamos o que está previsto no artigo 2º da lei: Poderão concorrer às vagas reservadas a candidatos negros aqueles que se autodeclararem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso público, conforme o quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE”.

A lei não restringe os pardos, aos “negros de cor parda” como foi o inovador critério acima apresentado por uma banca examinadora.

13.4. O que as bancas levam em consideração para avaliar se um candidato pode ser cotista?

Uma delas responde a questão da seguinte forma:

As características fenotípicas avaliadas aludem aos tons de pele, às texturas de cabelos e aos traços fisionômicos, elementos visuais que, via de regra, servem como marcadores para excluir pessoas negras, a despeito de seus potenciais. Esses marcadores, que, historicamente, foram utilizados como demérito, são referências para garantir o acesso da população negra aos espaços dos quais sempre esteve alijada.”.

 

13.5. Como funciona a questão da cor da pele?

Dentro das características fenotípicas do candidato, a serem avaliadas pela banca examinadora, a cor da pele sempre é considerada.

A cor desempenha vários papéis desejáveis na classificação, a principal é funcionar como aproximação da pertença racial dos indivíduos, pois é a marca mais importante considerada nas situações concretas para a definição dessa pertença.

Geralmente a cor de uma pessoa está relacionada às demais marcas que esta tem, embora haja exceções a tal regularidade.

 

13.6. Fui submetido a aferição do fenótipo pela comissão de heteroidentificação e não passei. Fui eliminado do concurso. Isto está correto?

Essa regra desclassificatória só pode ser adotada se houver previsão expressa no edital.

 

13.7. A comissão de heteroidentificação me reprovou e não analisou as provas, fotos e documentos que apresentei. Eu possuo ascendência de pais negros e eu sou pardo. Posso colocar no processo administrativo fotos dos meus pais? Como proceder?

Como já explicado no texto, a carga genética da pessoa não é levada em consideração. O que é avaliado são as características fenotipicas próprias dos candidatos.

 

13.8. Fui reprovado sem base alguma em critérios objetivos/científicos. Inclusive para meu recurso administrativo foi apresentada uma resposta genérica, sem entrar em detalhes do meu caso específico. Esse comportamento da banca examinadora é legal?

As bancas em geral adotam respostas genéricas prontas. O ideal seria que no edital estivesse explicito quais os critérios e parâmetros que serão utilizados para se aferir se o candidato é ou não enquadrado no sistema de cotas raciais.

 

14. Finalizado o concurso, tendo-se as listas de candidatos aprovados “por categorias”, como se dará a nomeação?

A lei determina que: “A nomeação dos candidatos aprovados respeitará os critérios de alternância e proporcionalidade, que consideram a relação entre o número de vagas total e o número de vagas reservadas a candidatos com deficiência e a candidatos negros”.

Ao final do concurso, haverá uma relação de aprovados na (i) ampla concorrência, outra lista de aprovados dentre aquelas pessoas que concorreram nas (ii) vagas reservadas a candidatos inscritos como deficientes e, uma terceira lista de (iii) negros.

Vamos fazer um exemplo numérico, hipotético, para facilitar o entendimento.

  Vagas disponibilizadas Quantidade de aprovados
Ampla concorrência 6 (= 60% das vagas) 90
Cota para portadores de deficiência 2 (= 20% das vagas) 10
Cota para negros ou pardos 2 (= 20% das vagas) 22
  10 122

Na nomeação, para se considerar os candidatos em números inteiros (igual a um indivíduo), a nomeação será feita em blocos de 5 candidatos.

Observação: se considerou que as notas obtidas pelos cotistas (negros/pardos e portadores de deficiência) foi inferior a nota dos candidatos de ampla concorrência classificados e nomeados.

 

Questão relevante: Caso em um concurso haja vagas para determinado cargo, mas em cidades diferentes, e para uma determinada cidade tenha sido aberta (criadas por medida provisória) 4 vagas pra essa cidade, podem 3 vagas destas serem preenchidas por cotistas? Ou a instituição deveria fazer um classificação única da região e convocar pela ordem de classificação da lei?

Resposta: A legislação fala que a reserva do porcentual deve se dar a partir da totalidade das vagas do Edital, independentemente das vagas regionalizadas. Contudo, a justiça tem se dividindo no sentido de adotar o percentual (i) para a totalidade das vagas, ou (ii) para as vagas regionalizadas. O entendimento mais recente e, aparentemente, predominante, é que a Administração Pública deva considerar o porcentual da cota em face da divisão estabelecida no Edital, e não no número global de cotas oferecida. Contudo, o Edital deve ser analisado em particular, com observação das suas particularidades.

 

15. Da tomada da posse

Chegou o dia da posse, e o agente público que dará a posse não considera que o candidato a ser empossado seja preto ou pardo. O que ele pode fazer? Ele pode não dar a posse?

Ele não pode fazer nada. O agente público não pode se negar a dar posse ao candidato aprovado dentro das cotas, mesmo que seja evidente a ausência de traços fenotípicos, se não vai incorrer no crime tipificado pelo art. 3º, da Lei nº 7.716/1989.

 

Caso Verídico – declaração tida como falsa

Paulo se inscreveu no concurso público tendo se auto declarado “afro-descendente” para fins legais, considerando-se como integrante dessa etnia.

No Certificado de Reservista de Paulo ele é descrito como de “cútis morena” e “cabelos pretos crespos”.

Paulo foi o primeiro colocado dentre os concorrentes ao cargo de Professor na cadeira “Biologia – Meio Ambiente”, já considerando a avaliação “objetiva e discursiva”, avaliação de “desempenho didático” e aferição de títulos.

Ele foi eliminado do concurso, mesmo sendo o 1º colocado geral, por supostamente ter fraudado sua autodeclaração.

Este absurdo foi revertido na Justiça, sob o entendimento que se o candidato inscrito para vaga reservada aos negros obtivesse classificação dentro do número de vagas destinadas à ampla concorrência, a vaga por ele ocupada não seria considerada como vaga reservada, mas sim como uma das vagas destinadas à concorrência geral.

 

E aí, as explicações sobre as possibilidades do exercício das Cotas Raciais lhe foram úteis? Encontrou a solução que se encaixa perfeitamente ao seu caso específico ao longo do texto? Comente e compartilhe o seu comentário!

 

AUTOR:

Cristiano Nunes Gonçalves

Pós-Graduado em Direito. ADVOGADO. Doutor em Agronomia. ENGENHEIRO Agrônomo. PROFESSOR. ANALISTA em Ciência e Tecnologia Sênior.

 

 

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Cristiano Gonçalves

Editor do Blog. Pós-Graduado em Direito. Advogado. Doutor em Ciência do Solo. Mestre em Agronomia. Engenheiro Agrônomo. Professor. Analista em Ciência e Tecnologia Sênior do CNPq.

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