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Comprei meu imóvel na planta e não entregaram no prazo. E agora?

Como funciona o prazo de tolerância para entrega?

Os contratos de promessa de compra e venda de imóveis “na planta” (“no pé” ou “no chão”) são muito comuns no Brasil. A divisão dos custos faz com que a aquisição seja mais barata, tornando atrativo o negócio.

O problema tratado neste post não está no tipo negócio. O problema é que você, o comprador, recebe do vendedor a promessa que o imóvel lhe será entregue em uma determinada data, e quando chega essa data de profunda realização pessoal, o imóvel não é entregue, transformando o sonho em pesadelo e insegurança.

Para saber tudo a respeito deste lamentável problema, leia o texto abaixo.

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1. Data prevista para entrega

É usual que, ao se dirigir ao stand de vendas, o interessado receba a informação da data prevista para a entrega do imóvel. Uma data de entrega mais próxima é usada para convencer o comprador a adquirir o bem justamente em função de sua proximidade.

A data de entrega na verdade é apenas estimativa (uma previsão, uma expectativa).

Muitas pessoas realizam um planejamento familiar com base na data informada para a entrega do imóvel, como: casamento, contrato de locação, mudança de escola dos filhos, entre outros.

O incorporador, ao estipular o prazo de entrega, já deveria considerar a possibilidade de atraso, de forma que o consumidor não fosse seduzido com a informação de que o imóvel seria entregue em determinada data e, posteriormente, o prazo fosse ampliado de forma substancial.

O prazo de entrega NÃO PODE estar ligado a ocorrência de um evento no futuro. Exemplo: algumas construtoras colocam que o prazo de entrega irá começar a contar a partir da assinatura do contrato ao comprador com o banco. Isso não pode!

 

2. Prazo de tolerância – prorrogação do prazo de entrega

Os contratos de compra e venda de imóveis são longos, e neles há uma cláusula de previsão de prorrogação imotivada do prazo para entrega do bem.

Quer dizer que existe uma cláusula que diz que o imóvel me será entregue até uma determinada data e outra que diz que não precisa entregar nessa data? É isso mesmo? O que isso significa?

Exatamente existem duas datas: (i) a que lhe prometeram a entrega (que é uma data prevista) e (ii) a em que termina o prazo que eles realmente devem fazer a entrega.

Essa cláusula do contrato que permite que o imóvel lhe seja entregue após a data inicialmente prevista é chamada de cláusulas de tolerância, de prorrogação ou de carência.

A justificativa para tal cláusula está atrelada ao entendimento que a incorporadora, por mais organizada que seja, logística e administrativamente falando, não teria condições de precisar a data de entrega do empreendimento. Para a justiça brasileira a cláusula de tolerância é válida e não há qualquer abusividade contratual relativa a previsão do elastecimento do prazo para a entrega da obra.

A cláusula de tolerância é válida porque (i) foi estabelecida entre comprador e vendedor no momento da assinatura do contrato, e (ii) a lei não proíbe a fixação de um prazo máximo de tolerância para a conclusão das obras.

Estou em dúvida… quando é então que posso considerar que a construtora não está cumprindo o contrato em relação ao prazo de entrega do imóvel?

O atraso da construtora só pode ser considerado a partir do vencimento do prazo de tolerância.

Como é uma cláusula contratual, para que a construtora utilize o limite do prazo de tolerância para então entregar o imóvel, ela NÃO precisa demonstrar o que aconteceu pra que a obra não fosse entregue na data prevista. Mas se a construtora for utilizar o prazo previsto na cláusula de tolerância deverá notificar, por escrito, o comprador do imóvel.

A cláusula de tolerância não pode superar o prazo de 180 dias corridos para prorrogar a data prevista de entrega de imóvel adquirido na planta. A fixação deste prazo em dias úteis é abusiva, e impõe exagerada desvantagem ao comprador, tornando a cláusula nula.

Se no contrato existir uma cláusula que preveja dilação ou prorrogação indefinida de prazo, frente as ocorrências ali descritas (para além dos 180 dias corridos), sem fixar uma data final para efetiva entrega do empreendimento, essa cláusula será nula.

Sugestão: Considere para seu planejamento pessoal e avaliação se a compra em questão é mesmo um bom negócio, que o imóvel só lhe será entregue 6 meses após a data de entrega prevista. Exemplo: a data de entrega prevista é dia 15 de abril, some 6 meses adicionais, e então você deve considerar que o imóvel só lhe será entregue no dia 15 de outubro.

 

Questão relevante: Comprei um imóvel e atrasou 10 meses além desses 180 dias de tolerância. Paguei aluguel durante esse período. Gostaria de saber se tenho como ser reembolsado? O valor do imóvel é R$ 200 mil. Posso fazer um distrato e receber o que paguei de entrada?

Resposta: Nesse caso você tem 2 opções: (1) você faz o distrato com devolução de 100% do valor já pagou e reembolso da comissão de corretagem OU (2) você continua com o imóvel e pede reembolso dos alugueis pelos 10 meses de atraso.

 

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3. A construtora disse que o atraso se deve a “caso fortuito” ou de “força maior”… isso é verdade?

Consta nos contratos de compra e venda de imóveis a previsão de que, na hipótese de ocorrência de caso fortuito ou força maior é possível prorrogar ainda mais a conclusão da obra. Ou seja, nestes casos a obra será entregue após a data de entrega prevista e após o prazo de tolerância.

O que geralmente então é aceito como “caso fortuito” ou de “força maior”?

  1. guerra ou perturbação da ordem pública; e
  2. incêndios e explosões que impeçam os trabalhos.

Muitas das alegações das construtoras que quererem entregar após o término do prazo de tolerância sem sofrerem nenhuma penalização são fatos ligados aos riscos do negócio da empresa, e a empresa deve assumir sem querer repassar seu ônus ao comprador.

NÃO constituem fatores imprevisíveis aptos a caracterizar o caso fortuito ou a força maior:

  1. chuvas em excesso que impeçam a execução das obras ou que impactem em fases específicas;
  2. greve ou greves gerais;
  3. paralisação dos meios de transporte;
  4. escassez de mão de obra qualificada na construção civil;
  5. falta ou demora na entrega de material;
  6. falta de equipamentos;
  7. aquecimento do mercado;
  8. mudanças na política econômica;
  9. crise econômica;
  10. alta dos preços;
  11. embargo do empreendimento, mesmo que por motivos alheios à construtora;
  12. entraves administrativos;
  13. atraso nas atividades do poder público, como entrega de Habite-se;
  14. atraso nas vistorias de alvarás sob responsabilidade de órgãos públicos;
  15. atraso pela concessionária de energia elétrica na aprovação do projeto elétrico do empreendimento;
  16. remanejamento da interferência de rede elétrica da concessionária;
  17. procedimentos estatais burocráticos, bem como imputados à exigências de concessionárias de serviços públicos essenciais (como água e energia elétrica);
  18. condições de constituição do solo não reveladas nas sondagens iniciais realizadas pela incorporadora no terreno do futuro empreendimento e que possa atrasar o início das obras.

Estes fatores devem ser levados em consideração pelas construtoras quando da estipulação do prazo de conclusão do empreendimento, e não possibilitam o aumento do prazo de entrega do imóvel.

 

4. Quando ocorre a efetiva entrega do imóvel pela construtora?

O imóvel é considerado como entregue na data da entrega das chaves (associada a possibilidade de pronto uso pelo comprador – efetiva posse), e não na data de expedição da Carta de Habite-se.

Isto porque o “habite-se” corresponde ao documento administrativo expedido pela municipalidade para atestar a adequação da obra e suas condições de habitabilidade, mas não representa a efetiva entrega da unidade para o seu promissário comprador, e não permite a efetiva utilização do imóvel pelo adquirente.

O inadimplemento do promitente comprador não afasta a responsabilidade da construtora pelo atraso da entrega do imóvel.

 

Questão relevante: Comprei um imóvel Minha Casa Minha Vida que está atrasado 2 anos. Nas vistorias do meu imóvel haviam problemas que não foram resolvidos. Estou aguardando para fazer a terceira vistoria. Posso fazer o distrato e receber 100% do valor pago? Posso cancelar o financiamento na Caixa? Observações: paguei entrada + corretagem + evolução de obra + estou pagando financiamento bancário (da CEF) faz 2 anos + aluguel…

Resposta: Por existir um atraso na entrega apenas da sua unidade, não é possível o distrato junto da CEF. Somente conseguiríamos esse distrato, caso fosse todo o empreendimento em atraso, pois a CEF responderia solidariamente.

Eu aconselho entrar com um processo pelo atraso na entrega do imóvel, eles serão obrigados a lhe pagarem o valor correspondente ao aluguel (veja o subitem 5.1), por todo o período de atraso, até a entrega do imóvel.

 

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5. O meu imóvel não foi entregue dentro do prazo de tolerância… Quais são os meus direitos?

Ultrapassado o prazo de 180 (cento e oitenta) dias de tolerância, o fornecedor/vendedor passa a se encontrar em mora (débito) perante o consumidor/adquirente.

Se o imóvel não for entregue até o final do prazo de tolerância, o comprador passa a ter alguns direitos enquanto durar o atraso.

Se o imóvel não lhe foi entregue na data prevista + o prazo de tolerância, seus direitos são:

 

5.1. Recebimento de lucros cessantes

Os lucros cessantes são devidos ao promitente comprador, ante a impossibilidade de usufruir do bem imóvel e de obter qualquer ganho com este, em razão do atraso na entrega pela construtora.

Nesta situação o comprador tem o direito a receber o valor correspondente ao aluguel médio da região, por cada mês de atraso, pela injusta privação do uso do bem.

Geralmente este valor é obtido atualizando o valor do imóvel comprado [ou do valor do contrato atualizado, multiplicando-se por 0,5% (ou 1%)] e multiplicado pela quantidade de meses de atraso até a efetiva entrega do imóvel.

Na verdade o comprador estará diante de uma opção, se o contrato prever cláusula de penalização da construtora pelo atraso, poderá escolher entre o recebimento de lucros cessantes ou da multa moratória.

Para o STJ: “A cláusula penal moratória tem a finalidade de indenizar pelo adimplemento tardio da obrigação, e, em regra, estabelecida em valor equivalente ao locativo, afasta-se sua cumulação com lucros cessantes”, ou seja, não podem ser acumulados.

 

5.2. Cláusula Penal

O Superior Tribunal de Justiça decidiu que: “No contrato de adesão firmado entre o comprador e a construtora/incorporadora, havendo previsão de cláusula penal apenas para o inadimplemento do adquirente, deverá ela ser considerada para a fixação da indenização pelo inadimplemento do vendedor. As obrigações heterogêneas (obrigações de fazer e de dar) serão convertidas em dinheiro, por arbitramento judicial.

O que isto significa? Significa que se o contrato tiver previsão de penalização APENAS para o comprador em caso de descumprimento do contrato, essa cláusula também pode ser usada contra a construtora no caso de atraso na entrega.

 

5.3. Da indenização por ocorrência de dano moral

Para o recebimento de indenização por dano moral este deverá ser efetivamente comprovado.

O mero atraso na entrega de imóvel adquirido na planta não gera, por si só, o dever de indenização por danos morais.

Para a configuração de danos morais, deve-se ter provas de uma lesão à esfera íntima de suas vítimas. A pessoa deve estar realmente abalada, e deve comprovar que o descumprimento contratual gerou mais do que aborrecimentos decorrentes das negociações de rotina, e não devem ser confundidos com danos materiais.

O atraso na entrega da obra apto a gerar o dano moral deve ser longo o suficiente para causar lesão aos direitos de personalidade do promitente comprador.

 

5.4. Da indenização pela ocorrência de danos emergentes

Pode até se pensar na fixação de outra indenização por danos materiais, caracterizada como danos emergentes, nos casos em que o comprador se veja obrigado a locar um imóvel em virtude do descumprimento pelo fornecedor.

 

5.5. Responsabilidade de pagamento de impostos e condomínios pela construtora

Enquanto não ocorrer a entrega das chaves ao consumidor/adquirente, as despesas com o imóvel – a exemplo de tributos (ITPU/TLP) e taxas condominiais – são de responsabilidade do fornecedor/vendedor.

É abusiva a cláusula contratual que obriga o consumidor a pagar taxas condominiais e IPTU relativamente a período anterior à entrega das chaves. A efetiva posse do imóvel, com a entrega das chaves, define o momento a partir do qual surge para o condômino a obrigação de efetuar o pagamento das despesas condominiais.

 

5.6. Interrupção do pagamento de parcelas

No caso de atraso na entrega da unidade autônoma tem-se a possibilidade de o consumidor/adquirente cessar o pagamento das parcelas que vencem durante tal período, até que ocorra a entrega das chaves, sem que incidam quaisquer juros ou multas.

Contudo, ainda assim, não fica suspensa a correção monetária do saldo devedor, mas apenas a possibilidade de que substituição do índice (indexador) contratualmente previsto (normalmente o Índice Nacional da Construção Civil (INCC) por outro mais favorável ao consumidor (normalmente o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA). Pode ser tentado, ainda, que o saldo devedor não sofra correção por qualquer índice.

 

5.7. Dos juros de obra (juros de evolução da obra ou taxa de evolução da obra)

Os chamados juros de obra, juros de evolução da obra ou taxa de evolução da obra, não podem incidir se após acabar o prazo de entrega do imóvel (incluído o prazo de tolerância), o imóvel não tiver sido efetivamente entregue.

Neste caso, o fornecedor/vendedor arcar com tal ônus.

 

5.8. Possibilidade de rescisão (ou resolução) do contrato

Você será ressarcido de tudo que foi pago para qualquer destinatário que tenha relação com o imóvel adquirido (construtora, corretor, condomínio, etc.), devidamente corrigido com juros e correção monetária.

Pode ser requerido ainda a execução da cláusula penal em desfavor da construtora.

 

6. Conclusão

Em suma, os contratos desta espécie guardam algumas questões complexas, que demandam uma análise cuidadosa sobre suas cláusulas e as repercussões jurídicas advindas de sua interpretação e das condutas do fornecedor/vendedor, devendo ainda se observar os reflexos quanto a rescisão ou não do ajuste (e as implicações quanto a mora ou inadimplemento).

Como são questões mais técnicas, um pouco mais difíceis de serem explicadas em textos desta natureza, sugere-se a consulta a um advogado.

 

Questão relevante: Comprei um lote de uma incorporadora, o prazo de entrega era de 1 ano prorrogável para mais 1 ano. O prazo se passou e se estende por mais 2 meses. Gostaria de fazer o distrato, será que consigo receber 100% do dinheiro que paguei?

Resposta: Sim, tendo em vista que a incorporadora não cumpriu com sua obrigação contratual (entrega do imóvel dentro do prazo contratual), você pode pedir o distrato com culpa da incorporadora. Nesse caso você receberá 100% do valor pagos e também a comissão de corretagem se tiver pago.

 

                 E aí, as explicações sobre o prazo de tolerância na entrega de imóveis na planta lhe foram úteis? Encontrou a solução que se encaixa perfeitamente ao seu caso específico ao longo do texto? Comente e compartilhe o seu comentário!

 

AUTOR:

Cristiano Nunes Gonçalves

Pós-Graduado em Direito. ADVOGADO. Doutor em Agronomia. ENGENHEIRO Agrônomo. PROFESSOR. ANALISTA em Ciência e Tecnologia Sênior.

 

 

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Cristiano Gonçalves

Editor do Blog. Pós-Graduado em Direito. Advogado. Doutor em Ciência do Solo. Mestre em Agronomia. Engenheiro Agrônomo. Professor. Analista em Ciência e Tecnologia Sênior do CNPq.

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